segunda-feira, 23 de maio de 2011

A formação do farmacêutico e o SUS: corporativismo ou multiprofissionalismo?

Texto escrito com base para minha participação na mesa-redonda de tema: A formação do farmacêutico e o SUS: corporativismo ou multiprofissionalismo?  Essa atividade fazia parte do Seminário de Educação Farmacêutica, realizada em São Luís-Ma.  

Boa tarde!
O nosso objetivo hoje é entender a formação do farmacêutico e o Sistema Único de Saúde, uma problemática que ultrapassa a dualidade exposta no tema dessa mesa, corporativismo ou multiprofissionalismo. No entanto, comecemos por entender essa dualidade analisando suas conceituações e propósitos.
Por corporativismo podemos entender a defesa de ações para privilegiar um determinado grupo organizados, por exemplo os farmacêuticos, em detrimento ou sem avaliar os riscos ao interesse público. No caso em questão, a inserção do farmacêutico no SUS, fica claro em nosso pensamento as vantagens ao interesse público dessa reivindicação. Então onde resguarda-se o corporativismo? Resguarda-se quando a defesa é limitada a criação de vagas sem preocupa-se com a analise profunda da função a ser assumida por este profissional.
Eis que surge o termo multiprofissionalismo!  Muitos dirão que o farmacêutico terá a função de integrar a equipe multiprofissional, para realizar um trabalho mais holístico e em cooperação com outros profissionais. Algo de grande valia, mas como a realidade do trabalho multiprofissional tem se apresentado?
Não é suficiente em um serviço de saúde colocar múltiplos profissionais juntos para trabalharem com o mesmo paciente, pois corre-se o risco de continuar a compartimentalizar o individuo. O paciente passa a ser visto por diferentes vertentes, as quais pouco interagem entre si e em sua maioria priorizam o entendimento biológico do corpo humano. Logo, não é suficiente a defesa do multiprofissionalismo, assim como da inserção do farmacêutico desprovido de uma compreensão mais madura de todo processo saúde-doença.
            Dito tais termos, podemos retomar as primeiras linhas dessa fala, em que apontamos para a necessidade de uma discussão para além da dualidade corporativismo e multiprofissionalismo. Defender uma formação farmacêutico voltada para o SUS, ou melhor, em prol de uma saúde pública, é prover os acadêmicos de munição teórico-prática para uma conduta clínica e organizativa do sistema, para além do modelo médico-biológico e das incursões privativistas dos bens públicos.  
            Não almejamos segregar prática clínica da organização sócio-política do SUS na formação profissional, apenas as distinguimos em termos como recurso metodológico. Infelizmente, esta segregação é uma realidade hoje ao observarmos a desvinculação dos profissionais ditos gestores daqueles do serviço.
            A clínica atual é um reflexo de uma construção histórica do cuidado em saúde e também reproduzem muitas coisas do modelo socioeconômico vigente em cada época. A própria formação acadêmica de todos profissionais da saúde ocorre com a transmissão de conhecimento e técnicas que irão reproduzir as práticas clínicas de seu tempo. Em contrapartida, existe sempre, em maior ou menor grau, vertentes para subjugar tais práticas, e é neste movimento de contradições, que os profissionais e as práticas de saúde vão se forjando. Vamos vivendo de transformações pontuais, ora mais intensas, oras mais resistentes.
            Para refletirmos um pouco mais sobre a prática clínica resgatamos um termo muito em voga, humanização. Vários profissionais em saúde tem dedicado-se em pensar como humanizar suas práticas e de seus colegas. A principio soa estranho a necessidade de humanizar o homem, para isso analisemos um dos pontos dessa questão.  Na maior parte de nossa prática clínica entendemos o paciente como um emaranhado de processos fisiológicos e bioquímicos, os quais por algum motivo não encontram-se normais. Quando na verdade, precisamos entende-lo como homem, ou seja, precisamos compreender nosso paciente como um homem. E o que é o Homem? Um corpo composto por um emaranhado de processos fisiológicos e bioquímico em vida social.
            Diferente das lentas e quase escassas mudanças comportamentais e reflexivas na clínica do cuidado em saúde, observa-se um fervoroso e continuo desenvolvimento tecnológico e científicos na área da saúde. Entre fabulosos equipamentos e técnicas  modernas de diagnostico e terapêutica, escondemos de maneira tímida, nossas limitações em compreender elementos do processo saúde-doença que ultrapassam os compêndios das ciências medicas e biológicas. Eis um primeiro desafio a nós profissionais, professores e acadêmicos, sairmos de nossos esconderijos!
            Em nosso divisão didática, seguimos com a organização socioeconômica do SUS. A defesa apontada para uma outra prática clínica não poderá desvincular-se da construção de um sistema de saúde pública fortificado. Imagine, como uma equipe do PSF poderá assistir com neutralidade a precarização da sua unidade de saúde e os reflexos sobre o processo saúde de sua população? Hoje muitos colegas observam-se nesta cena, mas pouco conseguem pensar em alternativas de resistência. A academia precisa também prepararmos para tecer analises sociais solidificadas e abrangentes, capazes de perceber os múltiplos determinantes envolvidos na organização dos serviços de saúde em todos os níveis. Tal conhecimento será fundamental na compreensão do seu meio de trabalho, em travar discussões com comunidade e na promoção da organização dos trabalhadores e comunidade para reivindicar melhorias. Eis um segundo desafio!!
            Como o espaço é curto nos deteremos em uma solução a esta questão, sendo exposto em linhas gerais para discussões futuras. Em termos convencionais ao nosso meio seria a educação em serviço, em outra palavras, aliar a formação acadêmica as necessidades reais da classe trabalhadora dentro de sua comunidade e postos de trabalho. Expor desde os momentos iniciais os estudantes a realidade do cuidado em saúde, aliada a uma orientação devida e amparados por conhecimentos que ultrapassam os limites das ciências medicas e biológicas. O estudante nesse processo não poderá ser confundido com mais uma mão-de-obra a realizar diferentes funções com bases no seu arcabouço teórico, mas deverá ser visto como um trabalhador a exercer funções de sua área sob um regime que lhe permita pensar e analisar as problemáticas a sua volta.   
Para o nosso momento devemos continuar debates como esses, produzir conhecimento na área de educação em saúde  e exercitar na prática metodologias de ensino aprendizado. Como estes elementos conseguiremos aumentar as tensões dentro do processo educacional hegemônico, até um determinado limiar onde ficará claro, que as mudanças efetivas só poderão ocorrer em todas as instâncias da sociedade, pois aprendemos entre outras coisas, a descompartimentalizar a vida humana.

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